Matéria do Portal Plural com a participação do Presidente do Simepar, Dr. Marlus Volney de Morais, e do Vereador de Curitiba Dalton Borba.
Mãe de uma criança de 1 ano e 5 meses, Josmeire Valtim Hudson levou o filho para uma consulta à Unidade Básica de Saúde Lotiguaçu, em Curitiba, mas não encontrou nenhum pediatra disponível para atendimento.
“Ali ele nunca foi atendido por pediatra. Sempre por clínica geral ou enfermeira. Um mês você passa pela médica clínica e na outra pela enfermeira, mas meu filho nunca viu um pediatra ali no posto de saúde”, critica a mãe.
Atualmente, de acordo com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Curitiba, o município tem 93 pediatras na Atenção Básica, nas Unidades de Pronto Atendimento (UPA) e Hospital Bairro Novo.
Segundo o Sindicato dos Médicos no Estado do Paraná (Simepar), o número de pediatras é insuficiente para atender a demanda. “Apesar do inverno quente, este ano tivemos um aumento de quadros respiratórios em pacientes pediátricos que exige mais presença de pediatras”, observa o presidente do Simepar, Marlus Volney de Morais.
A preocupação do Simepar levou a uma reunião com a participação do vereador Dalton Borba (PDT). Além do número de pediatras, foram apontadas outras questões que, segundo os médicos, dificultam o trabalho.
Uma delas – já recorrente – é o “controle de fluxo”. Eles alegam que há um tempo limite para cada consulta, o que, para os médicos, prejudica o atendimento dos pacientes. “Não tem como cronometrar uma consulta, ainda mais com crianças. Precisamos tirar a roupa, apalpar, falar com a mãe ou pai, não podemos abreviar os exames. Também recebemos relatos de médicos que são cobrados por ir ao banheiro”, lamenta Morais.
Dalton Borba enviou um pedido de informações à Secretaria de Saúde questionando a quantidade de médicos que atuam no sistema público de saúde de Curitiba, entre outros pontos. Além disso, o documento também pede especificamente detalhes sobre a cronometragem de tempo para as consultas. O pedido ainda não foi atendido.
Ao Plural, a Secretaria de Saúde disse que “o tempo para os atendimentos nas consultas médicas depende da complexidade de cada caso e da necessidade da conduta médica, dentro de padrões internacionais que orientam sobre o tempo médio de consulta médica, o que permite a organização e padronização das agendas em toda sua rede de atenção”.
Onde estão os pediatras?
Como no caso de Josmeire, não é incomum que crianças sejam atendidas por clínicos gerais ou outros profissionais de saúde. Para a prefeitura, não há problema nisso. Segundo a Secretaria de Saúde “Curitiba segue o que preconiza a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) do Ministério da Saúde, que define as diretrizes e normas do funcionamento da atenção nas Unidades de Saúde”.
Nesse sentido, justifica a prefeitura, na “Atenção Básica, o atendimento médico é feito prioritariamente por generalista ou médico da família, sendo o especialista acionado quando for constatada a necessidade específica de acompanhamento”.
Depois das reclamações do Simepar, a prefeitura afirmou que contratará dez novos pediatras via Fundação Estatal de Atenção à Saúde (Feas), mas o número ainda é baixo, segundo o sindicato.
Em 2019 o Plural fez um levantamento baseado no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde do Sistema Único de Saúde. Os dados revelaram que Curitiba tinha 759 profissionais pediatras ou cirurgiões pediatras ativos no sistema. Ou seja, de todos os médicos dessa especialidade, 56,39% estavam alocados em quatro instituições: Pequeno Príncipe, Hospital de Clínicas, Hospital do Trabalhador e Hospital Universitário Evangélico.
A Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) não prevê obrigatoriedade de especialistas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), o que, conforme a prefeitura, permite o chamado “atendimento multiprofissional”. Por esta razão o filho de Josmeire foi atendido por uma enfermeira.
Nos casos em que a avaliação dos profissionais considere necessário um encaminhamento para especialistas, o paciente é encaminhado para a uma nova consulta.
Já nas Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs), acionadas em casos urgentes, o atendimento é feito por especialistas em emergência, já que o Ministério da Saúde também não prevê obrigatoriedade de especialistas de outras áreas. “Ainda assim, Curitiba conta com pediatras nas UPAs. Eles são acionados, durante o atendimento de crianças, quando é verificada a necessidade, especialmente nos casos graves”, afirma a Secretaria de Saúde.
No entanto, de acordo com Josmeire, ela também não conseguiu atendimento pediátrico na UPA que fica no bairro Centenário. “Eu já levei meu filho lá com febre e mesmo sendo urgência tive que insistir para ele ser consultado. O médico mal encostou e me deu um diagnóstico. Aí, depois uma outra médica do mesmo lugar fez uma nova consulta e me disse que era outra coisa. É complicado.”
Hospitais
Quando o filho nasceu, em meio à pandemia, precisou de atendimento médico com apenas dez dias de vida. O encaminhamento foi feito pela própria maternidade. Esta foi a última vez que o garotinho foi consultado por um pediatra no Sistema Único de Saúde. Depois disso, a família recorreu ao plano de saúde (que foi cancelado com a retomada do funcionamento das unidades básicas de saúde).
Nesta situação, pacientes pediátricos que precisam de atendimento em hospital podem ser direcionados para hospitais, por exemplo o Pequeno Príncipe. Lá há 35 especialidades na área de pediatria, com 378 leitos dos mais de 60% são destinados para atendimento do SUS.
Conforme o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de SUS, 56,39% dos pediatras que atuam na rede pública de Curitiba estavam alocados em quatro instituições: além do Pequeno Príncipe, o Hospital de Clínicas, Hospital do Trabalhador e Hospital Universitário Evangélico. Os dados são de 2019.
O ideal, todavia, é que houvesse mais pediatras já na atenção básica. O diretor-técnico do Hospital Pequeno Príncipe e representante do Paraná no Conselho Federal de Medicina, Donizetti Dimer Giamberardino Filho, concorda. “Em um universo de cerca de 500 mil médicos, existem aproximadamente 40 mil pediatras – que precisariam estar inseridos nas unidades básicas de saúde, principalmente até contarmos com um número maior de médicos da família, que hoje somam sete mil –, apenas 10% do necessário para suprir a demanda dos brasileiros”, afirma.