Matéria do Portal Bem Paraná.
Na medida em que o tempo passa, a crise no abastecimento de fármacos se agrava no Paraná. Nas últimas semanas, medicamentos vários e para o tratamento de doenças diversas já “desapareceram” das prateleiras de farmácias.
Quando novos estoques chegam, logo são adquiridos pelos consumidores e voltam a ficar em falta. Para piorar, a situação deve se estender por, pelo menos, mais três meses, o que indica tendência de piora na crise, uma vez que o inverno se aproxima.
De acordo com o Sindicato do Comércio Varejista de Produtos Farmacêuticos (Sindifarma), mais de 500 medicamentos estão hoje em falta e nas últimas semanas têm aumentado a quantidade e diversidade de itens com problema no fornecimento. A situação, por ora, atinge principalmente os antibióticos de uso pediátrico (quase todos faltando), colírios, pastilhas para gargante, corticoides, xaropes para tosse e soluções líquidas de uso pediátrico.
“Teve um leve aumento no número de itens faltando [nas últimas semanas]. Alguns dos itens que estavam faltando entraram na distribuidora, mas em quantidade pequena, não deu para suprir o déficit. Esquentou as prateleiras e já está faltando de volta”, comenta Edenir Zandona Junior, presidente do Sindifarma. “Amanhã vamos receber betametasona e colírio, que vinham há quatro meses faltando. Mas daí já vai ter um outro medicamento entrando em falta. Entra um, sai outro, e assim vai indo”, complementa
O cenário atual é reflexo de uma série de fatores. Entre eles, a dificuldade de importar insumos da China (que está saindo de um lockdown severo por conta de uma nova onda de Covid-19) e da Índia, os maiores produtores do setor.
Além disso, a guerra entre Rússia e Ucrânia têm dificultado a produção e a logística de distribuição do insumo porque vários portos estão fechados. Para completar, a chegada do frio fez ainda disparar a demanda por antialérgicos, xaropes e antibióticos, entre outros medicamentos, evidenciando uma crise de abastecimento que já perdura alguns meses e deve se prolongar ainda mais.
“As pessoas ficaram muito tempo isoladas, isso baixa a resistência e tem muita gente com síndrome respiratória ao mesmo tempo. Criançada voltou para a escola e percebemos também uma alta de crianças precisando de medicamentos, antibióticos, e essa demanda toda tem aumentado o consumo, o que nos deixa um pouco preocupados”, comenta Flaviano Ventorim, presidente do Sindicato dos Hospitais e Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Paraná (Sindipar).
Tal preocupação não é à toa. Mesmo com anos de atuação no setor, tanto o presidente do Sindipar como o do Sindifarma reconhecem que o cenário atual é inédito, mais grave do que outras situações que o mercado farmacêutico já enfrentou.
“No período da Covid teve explosão de consumo de máscara e também sabemos que eventualmente um ou outro medicamento some do mercado. Mas agora é muita coisa [em falta] ao mesmo tempo”, relata Ventorim, do Sindipar. “Uns quatro anos atrás teve uma situação dessas, com vários itens em falta e demora para voltar à normalidade. Mas eram itens muito pontuais, produtos muito pontuais, e não levou tanto tempo [para normalizar] nem teve essa magnitude. Já estamos desde o início do ano assim e a tendência é piorar. Nem entramos no inverno e já está assim, então imagine”, emenda Zandona Junior, do Sindifarma.
Hospitais fazem procura ‘meio insana’ até para comprar soro fisiológico
Presidente do Sindipar, Flaviano Ventorim comenta que os hospitais paranaenses tem tido dificuldade para adquirir soro fisiológico, dipirona injetável, antibióticos respiratórios e antialérgicos. Apesar disso, ele destaca que não há relato de hospitais que estejam sem medicações. E isso graças ao que ele próprio define como uma procura ‘meio insana’ em vários fornecedores para conseguir os fármacos necessários.
“Acaba sendo meio que uma loucura [a busca por reposição ou substituição de medicamentos em faltas]. Procuramos em vários fornecedores e o mercado é aquela: oferta e demanda. Tem menos produto, alguns fornecedores elevam o preço e isso prejudica o sistema como um todo, até porque tivemos recentemente um aumento [no preço] dos remédios que foi impactante para os hospitais”, diz Ventorim, comentando ainda que, em princípio, não há temor com relação à possibilidade de os hospitais virem a ficar sem algum medicamento.
“A indústria não parou, o que tem alegado é dificuldade para repor estoques. Encontramos os medicamentos, mas não com a facilidade que tínhamos antes”, aponta ele, ressaltando ainda que, por ora, a indústria não sinalizou qualquer plano ou estratégia para contornar a situação. “Só dizem que estão tentando normalizar o estoque, mas não recebemos um feedback específico”.
Prefeitura de Curitiba também admite dificuldade na aquisição de novos lotes de medicamentos
Procurada pelo Bem Paraná, a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) de Curitiba comentou, por meio de nota, que não há falta de medicamentos para pacientes atendidos na rede SUS da capital paranaense atualmente. Ainda segundo a pasta, os medicamentos que fazem parte da Farmácia Curitibana estão disponíveis nas unidades municipais e também há estoque no almoxarifado da SMS.
“Assim como outros municípios brasileiros, porém, Curitiba observa uma dificuldade na aquisição de novos lotes de alguns antibióticos, antitérmicos, analgésicos e antialérgicos. Essa dificuldade está relacionada à dinâmica do mercado e da indústria farmacêutica atualmente no país. Atentos a essa realidade, o município trabalha sempre no sentido de buscar opções terapêuticas para que não ocorra desabastecimento no futuro”, destacou ainda a pasta na nota encaminhada à reportagem.
Já a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) também foi procurada e comentou que, em caso de falta de algum fármaco, a prática da pasta é orientar a substituição de medicamentos que se encontram com problemas de abastecimento por outras opções terapêuticas cujo fornecimento esteja regularizado.
Além disso, a pasta também revelou que “o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) está realizando um levantamento junto às SES [Secretarias de Saúde] sobre dificuldades de aquisição que possam estar relacionadas a falhas de mercado para realizar tratativas junto aos órgãos competentes.”
Orientações ao consumidor
Para o consumidor, a crise no abastecimento de fármacos se reflete na dificuldade para pacientes conseguirem acesso a alguns medicamentos. “Cefalexina líquida, por exemplo, chegou, mas numa quantidade tão pequena que em um, dois dias, o mercado já tinha absorvido tudo.As quantidades que estão produzindo não é suficiente para sanar o problema”, afirma Edenir Zandona Junior, presidente do Sindifarma, dando ainda uma orientação à população. “O que orientamos é que o consumidor, quando não encontra determinada medicação, ligue pro médico para tentar outra alternativa, para que o paciente possa ser medicado e resolver o problema dele. Não adianta ficar batendo na mesma tecla e gastar dois, três tanques de combustível [em busca de um medicamento que está em falta]”.