Artigo publicado pelo Portal Saúde Debate.
Medida foi anunciada por alguns estados após variante Delta; médica defende estratégia para aumentar logo imunização da população.
Sete estados e o Distrito Federal já anunciaram que vão reduzir o intervalo da aplicação da segunda dose da vacina da AstraZeneca e da Pfizer. No caso do Distrito Federal, que fez o anúncio nesta segunda-feira (12 de julho), a redução será de 90 para 60 dias. O objetivo é ampliar a capacidade de imunização da população contra a variante Delta do coronavírus, identificada originalmente na Índia. Mas reduzir o intervalo de aplicação da segunda dose da vacina pode ser uma boa estratégia?
O Estado de São Paulo, que também chegou a cogitar essa possibilidade, decidiu não reduzir o intervalo de aplicação da segunda dose, mantendo o cronograma previsto para quem já tomou a vacina da AstraZeneca e da Pfizer. O governo paulista estudou essa diminuição após confirmar a transmissão comunitária da variante Delta no Estado, mas informou que vai manter o intervalo já adotado porque pesquisas indicam, por exemplo, que a vacina da AstraZeneca gera uma eficácia maior com um período mais longo entre as duas doses.
Na semana passada, um estudo publicado na revista Nature, uma das mais respeitadas do mundo, apontou que apenas uma dose da vacina da AstraZeneca ou da Pfizer era pouco eficiente contra a variante Delta e a Beta, originária da África do Sul. No entanto, com duas doses, existe uma proteção contra essas cepas.
Desde o surgimento da variante Delta, laboratórios responsáveis pelas vacinas contra Covid-19 estudam o comportamento dos imunizantes neste cenário. No Brasil, até o momento, a variante Gama (identificada primeiramente no Amazonas) é a predominante.
Além do Distrito Federal, por enquanto, confirmaram a redução do intervalo da aplicação da segunda dose Pernambuco, Acre, Santa Catarina, Tocantins, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul e Piauí. O Ministério da Saúde segue recomendando o intervalo de 12 semanas, ou seja, três meses para a aplicação das doses da vacina da AstraZeneca e da Pfizer.
Reduzir intervalo se torna estratégico
A médica infectologista Thatiane Nakadomari, do Hospital São Vicente, de Curitiba (PR), explica que os estudos até o momento mostram que as vacinas são eficazes para as variantes que estão circulando no país.
No entanto, ela defende reduzir o intervalo de aplicação da segunda dose da vacina como uma estratégia para encerrar um ciclo crônico que se tornou a pandemia no Brasil, com sucessivos picos e quedas no número de casos e mortes. Com uma maior parcela da população vacinada completamente e logo, seria possível efetivamente colocar um freio na pandemia.
De acordo com a médica, ainda não existem estudos explicitando qual seria o impacto da redução do intervalo de aplicação da segunda dose da vacina contra Covid-19, mas a medida pode ser defendida em função da situação de emergência. “Realmente é necessário vacinar a maioria da população, pelo menos 70 a 80% das pessoas com as duas doses, para impedir que vire um ciclo crônico. Esta seria uma estratégia para frear esse ciclo constante de picos e quedas. Isso, cada vez mais, desgasta o serviço de saúde. Assim, um intervalo menor na aplicação da vacina poderia implicar na imunização da população mais rapidamente”, afirma.
A médica conta que aqueles que são infectados pelo coronavírus após a primeira dose da vacina devem desenvolver casos leves da Covid-19. No entanto, são potenciais transmissores do vírus, podendo gerar casos graves em outras pessoas. “A transmissão é um problema, criando mais riscos ainda. É necessário cortar essa rede de transmissão e a possibilidade de pacientes que podem ficar em estado grave”, avalia.
Thatiane Nakadomari lembra que existe um tempo necessário para que os anticorpos se desenvolvam após a aplicação da primeira dose, de pelo menos 15 dias. Nesse período, a pessoa segue suscetível. O mesmo acontece até a segunda dose, quando o esquema vacinal estará completo. Para isso, também são necessários pelo menos 15 dias para a ação da segunda dose da vacina.
A médica infectologista reforça que, em meio a esse processo, as medidas de prevenção são primordiais. Não apenas para evitar que a própria pessoa fique doente ou passe o coronavírus para contatos próximos, mas para coibir o surgimento de uma nova variante que seja capaz de gerar mais preocupação.
“A partir do momento que pelo menos 80% da população for vacinada, deveria existir um plano gradual de retomada das atividades. Deveria existir um controle para a retomada, principalmente quanto à aglomeração, com respeito pela população. Quanto mais aglomeração, mais o vírus roda. Quanto mais ele roda, mais mutação ele provoca. Se apenas parte da população estiver vacinada e houver aglomeração, não vai adiantar nada. Será um cenário para a criação de variantes, entrando num ciclo que não termina mais”, indica.
A médica enfatiza que a vacinação é uma estratégia de proteção coletiva. Por isso, enquanto a maior parte da população não estiver vacinada, não adianta pensar apenas individualmente. Essa imunidade coletiva é essencial para que o vírus pare de circular.