A candidata a vacina contra a dengue do Instituto Butantan, que apresentou eficácia de 79,6%, apresenta resultados bastante positivos, mas ainda precisa finalizar os ensaios clínicos e passar por processo regulatório antes de ser disponibilizada à população. A informação é do diretor do Instituto, Esper Kallás, que participou de uma entrevista coletiva junto ao governador de São Paulo em exercício, Felicio Ramuth, e ao secretário de Saúde, Eleuses Paiva, na manhã desta terça (6/2). Na semana passada, os primeiros dados do acompanhamento dos voluntários vacinados foram publicados na New England Journal of Medicine, uma das revistas científicas mais conceituadas do mundo.
“Os resultados que temos de dois anos são muito satisfatórios. Estamos na fase final de desenvolvimento do estudo de fase 3, que vai completar o acompanhamento do último voluntário no meio desse ano. Estamos consolidando os dados de seguimento controlado para saber se a proteção de 80% é sustentada durante cinco anos”, explicou Esper, que é médico infectologista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, e participou do estudo como investigador principal.
A análise de eficácia do imunizante foi feita ao longo de dois anos de acompanhamento de 16.235 voluntários de todo o Brasil, com idades de 2 a 59 anos, em 16 centros de pesquisa. Durante esse período, foram notificados apenas alguns casos de dengue entre os participantes. O estudo, que iniciou o recrutamento em 2016, seguirá até que todos os voluntários completem cinco anos de acompanhamento.
A proteção foi observada em todas as faixas etárias, sendo 90% em adultos de 18 a 59 anos, 77,8% dos 7 aos 17 e 80,1% nas crianças de 2 a 6 anos.
Em pessoas que já apresentavam anticorpos para a dengue antes do estudo, a proteção foi de 89,2%; naqueles que nunca tiveram contato com o vírus, a eficácia foi de 73,6%. O imunizante teve o mesmo perfil de segurança em ambos os grupos, representando uma vantagem em relação a outros disponíveis no mercado privado que são indicados preferencialmente para pessoas com infecção prévia.
A vacina do Butantan foi desenvolvida para proteger contra os quatro sorotipos do vírus da dengue (DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4). Como no período do estudo circularam apenas os sorotipos 1 e 2 no Brasil, até o momento foi possível descrever uma eficácia de 89,5% para DENV-1 e 69,6% para DENV-2.
Em relação à segurança, a maioria das reações adversas foi classificada como leve a moderada, sendo as principais dor e vermelhidão no local da injeção, dor de cabeça e fadiga. Eventos adversos sérios relacionados à vacina foram registrados em menos de 0,1% dos vacinados, e todos se recuperaram totalmente.
Uma grande vantagem potencial da candidata a imunizante do Butantan é que uma dose foi suficiente para fornecer uma proteção robusta contra a dengue, enquanto outras vacinas aprovadas exigem duas ou três doses. O esquema de dose única é muito mais favorável, principalmente durante epidemias, pois induz a proteção da população em um curto espaço de tempo, ajuda a alcançar uma maior cobertura vacinal e traz vantagens logísticas e econômicas.
Sobre a vacina
A tecnologia da vacina da dengue foi licenciada para o Instituto Butantan em 2009, pelo Instituto Nacional de Saúde Americano (NIH). A instituição norte-americana cedeu as patentes e os materiais biológicos referentes às quatro cepas virais que compõem o imunizante, permitindo que ele seja produzido e distribuído no Brasil.
Em 2018, o Butantan assinou um acordo de desenvolvimento e compartilhamento de dados com a farmacêutica multinacional MSD, que trabalha em uma vacina análoga, em uma ação conjunta para acelerar os estudos e registro do produto.
A fase 1 do ensaio clínico, desenvolvida nos Estados Unidos (2010-2012) pelo NIH, e a fase 2, conduzida no Brasil (2013-2015), mostraram que a vacina induz produção de anticorpos contra os quatro sorotipos do vírus, e que seu perfil de segurança fundamentava a continuidade dos estudos.
Impactos da dengue
A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que cerca de metade da população mundial (3,9 bilhões de pessoas) vive em risco de contrair dengue. Uma análise feita pela Universidade de Oxford estima que, até 2080, esse número pode chegar a 6 bilhões, devido ao aumento das temperaturas e da adaptação do mosquito Aedes aegypti a locais onde antes não circulava.
A cada ano, são registrados de 100 milhões a 400 milhões de casos de dengue no mundo. No Brasil, a doença acomete cerca de 1 milhão de pessoas anualmente. Em 2023, a incidência foi maior na região Sul (1.269,8 mil casos/100 mil habitantes), seguida da Sudeste (1.028,6 casos/100 mil habitantes) e da Centro-Oeste (935,9 casos/100 mil habitantes), conforme o Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde.
A maioria das pessoas não tem sintomas; outras, apresentam febre alta, dor de cabeça, dor no corpo, náuseas e manchas vermelhas na pele, que podem durar de uma a duas semanas. No entanto, alguns indivíduos podem desenvolver formas graves da doença, também conhecidas como dengue hemorrágica ou síndrome do choque da dengue, que acometem principalmente quem passa por uma segunda ou terceira infecção.
A dengue grave atinge um a cada 20 pacientes e costuma aparecer depois de três a sete dias do início dos sintomas, quando a febre começa a baixar. Nesse momento, o paciente pode sentir dor abdominal intensa, vômito persistente, sangramento nas gengivas ou nariz, queda de pressão arterial e dificuldade respiratória, entre outras complicações que podem levar à morte.
As informações são do Instituto Butantan.